Quando Zaratustra tinha 30 anos de idade deixou a sua casa e o lago de sua casa e subiu para as montanhas. Ali ele gozou do seu espírito e da sua solidão, e por dez anos não se cansou. Mas, por fim, uma mudança veio ao seu coração e, numa manhã, levantou-se de madrugada, colocou-se diante do sol, e assim lhe falou: Tu, grande estrela, que seria de tua felicidade se não houvesse aqueles para quem brilhas? Por dez anos tu vieste à minha caverna: tu te terias cansado de tua luz e de tua jornada, se eu, minha águia e minha serpente não estivéssemos à tua espera. Mas a cada manhã te esperávamos e tomávamos de ti o teu transbordamento, e te bendizíamos por isso. Eis que estou cansado na minha sabedoria, como uma abelha que ajuntou muito mel; tenho necessidade de mãos estendidas que a recebam. Mas, para isso, eu tenho de descer às profundezas, como tu o fazes na noite e mergulhas no mar… Como tu, eu também devo descer… Abençoa, pois, a taça que deseja esvaziar-se de novo…
Assim se inicia a saga de Zaratustra, com uma
meditação sobre a felicidade. A felicidade começa na solidão: uma taça que se
deixa encher com a alegria que transborda do sol. Mas vem o tempo quando a taça
se enche. Ela não mais pode conter aquilo que recebe. Deseja transbordar.
Acontece assim com a abelha que não mais consegue segurar em si o mel que
ajuntou; acontece com o seio, turgido de leite, que precisa da boca da criança
que o esvazie. A felicidade solitária é dolorosa. Zaratustra percebe então que
sua alma passa por uma metamorfose. Chegou a hora de uma alegria maior: a de
compartilhar com os homens a felicidade que nele mora. Seus olhos procuram mãos
estendidas que possam receber a sua riqueza. Zaratustra, o sábio, se transforma
em mestre. Pois ser mestre e isso: ensinar a felicidade.
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[Imagem Google]
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