terça-feira, 4 de novembro de 2008

Flashes de um Pesadelo


Quero escrever e é difícil.
Preciso. Tenho que escrever.
Conseguir tirar o que de mais profundo há em meu íntimo, encontrar respostas.
Respostas num passado longínquo que não sei como alcançar.

Minhas cicatrizes... Lembro de todas, exceto esta que está abaixo do seio direito (um pouco mais pra direita).
Não me lembro de mais nada.

Fragmentos ou flashes de uma infância com reflexo na adolescência e maturidade.

Na infância, eu bem pequena, um rosto no escuro.
Um corpo pesado, de homem (ou rapaz?), sobre meu corpo de criança.
Uma dor lancinante, aguda, entre as coxas.
Pressa.
Brincar escondido num vão de armazém ou de uma venda, meio escuro.
Eu, pequena!
Eu inocente. Sem saber, sem entender.
Hoje não consigo divisar se são flashes de sonho
Ou imagens entrecortadas de uma realidade acontecida.

(...)

Minha mãe.
Os gritos se confundem em minha cabeça.
Um choro que começa baixo e vai aumentando, entremeados aos gritos e perguntas gritadas a uma mãe já morta.
- Mamãe, mamããããããe! Ô, mamãe. Por quê, mamãe?
- Por quê, mamãe? Por quê, mamãe? Por quê, mamãããããããããe?
O choro e os gritos vão aumentando e nós, os filhos, acuados a um canto, sem entender.

Por vezes, a cena se repete dentro do banheiro, me conta um dos meus irmãos.
Meu pai.
Uma voz que se limitava a dizer “Calma, Rosa. Fica calma.”

Pergunto aos irmãos (todos são mais velhos que eu).
Ninguém sabe de nada, Não sabem o porquê. Só sabem das cenas.
Penso que, inconscientemente saibamos todos, mas a misericórdia divina tratou de apagar de nossa mente.

(...)

Meus sonhos sempre incompletos.
A cada aproximação do amor, a cama,
E surge a figura de minha mãe, a interromper. Acordo.

Mais tarde, nas devidas oportunidades, o medo volta.
E com o medo, a dor lancinante sobrepondo-se à entrada do desejo, recusa ao amor.
Brigas. Falta o entendimento, a clareza. E o companheiro não entende.
E a imaturidade e a falta de persistência e entendimento conduzem ao fracasso da união.

Só após anos mais tarde,
pude sentir-me mulher de verdade.
Meu verdadeiro homem sofre hoje (assim penso)
Com minha frieza e afastamento.
Homem de verdade que já nem sei mais se me quer
Pra companheira ou mulher.


Sandra Medina Costa
(ilustração: web)

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