domingo, 30 de novembro de 2008

A pequena vila

(Escrito por Evelyn Medina)

Era uma vez há muito tempo, quando o tempo ainda nem era tempo, uma pequena vila, onde moravam seis pessoas e um gato. Na primeira casa, sombria e escura, morava o Senhor Ranzinza, sempre resmungando, com a sua doce filha, Meiguice, que não fazia outra coisa senão contemplar seu querido pai, enfeitiçado por uma bruxa má que tempos atrás havia passado ali pela vila. A menina sempre pedia a Deus um milagre, para assim ter seu pai alegre e feliz como antigamente.
Na casa vizinha morava Dona Soberba. Guardava num grande cofre de madeira escura todo o seu tesouro. Jóias preciosas, adornadas com pérolas, rubis e brilhantes, e muitas moedas de ouro. Seus vestidos de seda enfeitados ricamente faziam-na bela e exuberante. Sua casa resplandecia, pois até suas cortinas, balançadas pelo vento, eram cheias de purpurina e lantejoulas.
A próxima casa era habitada por Dolorosa. Sempre ao cair da tarde, toda a vila, ouvia os seu lamentos. Como era infeliz. Nada mais tinha senão a sua dor. Até o gato, que circundava por todas as casas da vila, procurava passar longe daquela casa. Se porventura se descuidava e chegava mais perto acabava ficando triste e macambúzio. Teria a velha bruxa, visitado também aquela casa?
Numa casa de um verde resplandecente morava Esperança. Lembrava as campinas onde floresciam as mais variadas flores, onde os trigais amadureciam, onde os rebanhos pastavam calmamente. Seu jardim, apesar de pequeno, era lindo e variado. O gato gostava muito de ir à casa de Esperança. Ficava horas sem fim perseguindo as borboletas coloridas que vinham brincar com as flores. Aguçava os seus ouvidos enquanto Esperança cantava. Miava alegremente tentando imitá-la.
Na última casa da vila morava um velho sábio. Chegara ali antes de todos os outros. A virtude e a sabedoria eram suas únicas riquezas. Sentava sempre à porta de sua casa contemplando o pôr-do-sol, os pássaros, as florezinhas que enfeitavam a pequena vila. Tinha sempre ao seu lado o amigo gato, companheiro de tantos anos. Quando o gato miava alegremente ele sabia, com certeza, que ele estivera com Esperança ou com a pequena Meiguice. Mas, volta e meia o gato estava estranho, agitado, miando fortemente. O velho o pegava ao colo e o acalmava dizendo: - O que aconteceu? Venha, contemple a natureza e logo se acalmará. Vez por outra Meiguice se sentava ao pé do velho, contando, como em segredo, pedia sempre a Deus um milagre. O velho dizia: - você verá; quando menos esperar vai acontecer. E assim viviam, cada um seguindo a sua vida.
Numa tarde, como todas as outras, o velho sábio, sentado à porta de sua casa, suspirou: - Que silencio, sinto que alguma coisa está para acontecer.
E foi mesmo assim. Naquela madrugada, quando todos ainda dormiam, uma grande tromba dágua desabou sobre a pequena vila. A água veio forte, torrencial como as águas do dilúvio. Foi entrando nas casas sem pedir licença, foi varrendo, foi lavando, foi levando tudo. Quem mais tinha, mais perdia. Foi uma grande confusão. Mal dava pra se salvar a própria pele. O Senhor Ranzinza pegou no colo a pequenina Meiguice, beijando-a seguidamente, tentando acalmar a filha amada, o mais precioso e único bem que lhe restara. Dona Soberba saiu chorando porta afora, pois, inutilmente procurara encontrar, em meio à enxurrada, o seu precioso cofre. Seus lindos vestidos, sapatos, enfeites, tudo a chuva levara.
Dolorosa, no afã de salvar a própria vida, em nada mais pensou. Deixou que a água levasse também a dor de sua alma. Esperança parou um pouco de cantar, pois era enorme o barulho da chuva. Saíram todos de casa, encontrando o velho sábio,, que os esperava, com um grande guarda chuva. Morador antigo daquele lugar, ele sabia, que de tempos em tempos essa chuva caia para transformação das pessoas.
Dona Soberba chorava desconsoladamente. Dolorosa foi em sua direção, abraçou-a , procurando consola-la. Esperança cantou uma canção. – O sol voltará a brilhar, com certeza, vocês verão. Tudo vai mudar, vai melhorar. O velho sábio convidou-os para irem até sua casa, onde um chá quentinho, com biscoitos e pão de mel os esperava. Entraram, sentaram-se todos à roda do fogão e esquecidos da dor, ouviram o plano de Esperança. –Juntos, reconstruiremos a nossa vila. Dolorosa atalhou: - vamos ver o que nos sobrou e nos ajudarmos mutuamente. O senhor Ranzinza falou: - velho sábio, como vamos fazer? E ele lhes ensinava a maneira segura de reconstruírem suas casas. Enfim, estamos vivos e é isso que importa. Pegou Meiguice no colo e ela sorriu satisfeita. Dolorosa, abraçada agora com Esperança, planejava um futuro melhor. Perguntaram então ao velho sábio:- Meu bom amigo, podemos passar aqui esta noite, até cessar a tormenta? – Com muito prazer, ele respondeu..
Logo de manhã, um lindo sol brilhava no céu. Meiguice gritou:- corram, venham ver o arco-íris.Vieram todos pra ver.
Era um novo dia, um novo tempo para todos. Estavam felizes, apesar de nada terem, pois tinham um ao outro. Eram solidários e isso lhes bastava. O gato corria de cá para lá brincando com Meiguice, olhando encantado para as pessoas. Como estavam diferentes. O velho sábio entendeu o olhar do gato e pensou: - precisou vir uma tempestade para que aprendessem o segredo da vida... pois viver é uma arte.

Evelyn Medina



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